O clima de sensibilização na campanha eleitoral deve mudar o rumo dos chamados “não votos” no país. Antes do início da campanha, alguns analistas apostavam que o acumulado de brancos e nulos, mais abstenções, ia superar os 40% no primeiro turno e chegar a 50% no segundo, a exemplo do que ocorreu nas eleições suplementares para governador do Tocantins, em junho deste ano.
Entretanto, a polarização entre os extremos, representada por Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT), levarão o percentual no primeiro turno a um patamar menor. Nas eleições de 1994, a soma dos “não votos” foi de 33%. Em 1998, de 40%. Em 2014, 29%.
As previsões atuais são corroboradas por pesquisas de intenção de voto. A da Datafolha, divulgada na quinta-feira, 20, aponta que 12% do eleitorado está propenso a votar em branco ou nulo. Em 22 de agosto, esse índice estava em 22%.
O recuo de 10 pontos percentuais de não votos é acompanhado pelo crescimento de Bolsonaro e, sobretudo, Haddad. O presidenciável do PSL subiu seis pontos no período analisado, de 22% para 28%. Já o petista avançou 12 pontos, de 4% para 16%. Bolsonaro ganhou força após o atentado em Juiz de Fora (MG). No caso de Haddad, pesa a transferência de apoio de quem pretendia votar no ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, preso em Curitiba, condenado por corrupção e lavagem de dinheiro em segunda instância, portanto impedido de concorrer.
Analistas ressalvam, porém, que muita coisa pode mudar até 7 de outubro. Afinal, Ciro Gomes tem 13% das intenções de voto. E a soma de Geraldo Alckmin (PSDB) e Marina Silva (Rede) resulta em outros 16%. Há ainda Alvaro Dias (Pode), João Amoêdo (Novo) e Henrique Meirelles (MDB), que, têm juntos, 8%.
A retórica de que o ex-presidente Lula é preso político e as derrotas nas tentativas de participar das eleições criaram uma narrativa que emplaca Haddad como herdeiro político. A estratégia em torno da candidatura petista deu certo, a tal ponto que explica em parte a redução dos votos nulos, avalia o sociólogo e cientista político Paulo Baía, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Da mesma forma, a facada em Bolsonaro e a recuperação dele no hospital Albert Einstein, em São Paulo, contagiou parte do eleitorado e o impulsionou nas pesquisas.
Ambos os casos geram um ambiente de passionalidade que sensibiliza a campanha e empurra os eleitores a escolherem um candidato. “O clima não é para votar nulo. A eleição mobiliza a população e os não votos tendem a cair”, analisa Baía. O professor destaca, ainda, que Bolsonaro e Haddad são indissociáveis. À medida que o petista cresce nas pesquisas, Bolsonaro também avança, empurrado pela absorção de votos de Amoêdo, Alvaro Dias, Meirelles e Alckmin.
Da mesma forma que o voto útil do “antipetismo” alavanca Bolsonaro, Haddad também se beneficia da força de Lula, puxando votos que poderiam ir para Ciro e Marina. Ambas candidaturas se alimentam também pelo temor de um dos dois extremos vencerem as eleições, assim como Alckmin. E o efeito prático disso é a redução de eleitores inclinados a votar nulo ou branco, ou não comparecer às urnas, pondera Baía.
Pragmatismo
O ambiente sugere que o percentual de não votantes fique abaixo em relação às eleições municipais nas grandes capitais e também na comparação com os pleitos suplementares para governador de Amazonas, em 2017, e do Tocantins, neste ano. Boa parte do eleitorado votou sob desencanto com políticos e impactados pelos escândalos de corrupção revelados pela Operação Lava-Jato.
Na eleição municipal de São Paulo, vencida em primeiro turno, o acumulado de abstenções, votos nulos e brancos chegou a 38,5%. No Rio de Janeiro, esse percentual foi de 42,5% no primeiro turno e de 46,9% no segundo. No Amazonas, foi de 40,2% no primeiro e de 43,5% no segundo. Só não superou o desalento do eleitorado em Tocantins. Lá, os não votantes somaram 43,5% na primeira etapa e 51,8%, na segunda.
A possibilidade de os não votos ficarem abaixo de 40% é real, endossa o cientista político Geraldo Tadeu Monteiro, coordenador do Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas sobre a Democracia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). “Sempre que houver polarização, mais pessoas comparecem e diminui o número de nulos e brancos”, analisa.
As previsões de um percentual menor de não votantes não decorre apenas da polarização, avalia o cientista político Ricardo Ismael, professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ). Ele reconhece que existe um desalento e desconfiança muito grande dos eleitores em relação aos políticos, mas acredita que os eleitores votarão por uma questão mais pragmática, pensando em como resolver os problemas do país. “Alguém vai ter de começar a solucionar e, aí, não dá para ficar indiferente e não querer votar”, pondera.
Outras explicações para a previsão de um percentual menor de não votantes é o número de candidaturas competitivas. Embora Bolsonaro e Haddad estejam bem encaminhados para o segundo turno, Ismael acredita que Ciro, Alckmin e Marina são candidatos que podem ainda atrair alguns votos. “Quanto mais candidaturas tiverem chances de chegar ao segundo turno, maior vai ser o movimento de atrair e eleitores e menor será o número de abstenções e votos nulos e brancos”, justifica.
Por Diário de Pernambuco e Correio Braziliense
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