BRASÍLIA - A taxa de mortalidade por doenças associadas ao alcoolismo no País subiu de 10,7 para 12,64 óbitos por 100 mil habitantes em seis anos. Os dados, revelados em uma pesquisa feita pelo Ministério da Saúde, comparam os números registrados em 2000 e 2006 e, na avaliação de especialistas, o salto pode ser ainda maior. "Esta é uma mostra do grave problema de saúde pública provocado pelo excesso de bebida", assegura a coordenadora do Departamento de Análise de Situação de Saúde do Ministério da Saúde, Deborah Malta. No período analisado, foram contabilizados 146.349 óbitos associados ao consumo do álcool, média de 57 mortes por dia. Deste total, 92.946 estão plenamente ligadas ao excesso de bebida. Todas elas são consideradas mortes evitáveis. "O tratamento da dependência ao álcool é difícil, com taxas baixas de sucesso", observa Deborah. "Mas é possível prevenir. É nesse ponto que temos de melhorar as estratégias", completa. A elevação da taxa de óbitos demonstrada no levantamento é atribuída principalmente à melhor captação dos dados, considerados ainda subestimados. Autores do trabalho observam também que a pesquisa mostra apenas uma parcela do problema, a de doenças crônicas provocadas pelo uso da bebida. "Não podemos nos esquecer que, em casos de violência, boa parte das vítimas ou agressores está alcoolizada", diz Deborah. Além disso, uma parcela significativa dos acidentes de trânsito é provocada pela associação da bebida com a direção. "Se somarmos todos esses fatores, veremos que o número de vítimas é muito maior", completa. Mesmo subestimados, os números do trabalho mostram como é importante a adoção imediata de ações para garantir a prevenção do problema, afirma o psiquiatra e conselheiro do Conselho Regional de Medicina, Mauro Aranha. "É um erro achar que bebida alcoólica só faz mal para quem consome. Acidentes de trânsito, os números da violência estão aí para desmentir isso."
PERFIL
A maior parte das mortes diretamente ligadas ou associadas ao uso da bebida ocorre na faixa etária entre 30 e 59 anos, sobretudo entre homens. Mas a pesquisa mostra que as mortes relacionadas ao álcool ocorrem em todas as faixas etárias. Incluindo crianças e jovens. No período analisado, por exemplo, foram confirmadas seis mortes por envenenamento por álcool entre crianças de 0 a 4 anos. Na faixa entre 5 e 9 anos também ocorreram outras seis mortes. Entre 2000 e 2006, 271 crianças e jovens entre 0 e 19 anos morreram por causa da bebida - 231, entre 15 e 19 anos. Para Deborah, os dados da pesquisa são ainda mais preocupantes quando comparados com outros trabalhos, também desenvolvidos no Ministério da Saúde. Um deles aponta o aumento significativo do consumo excessivo de bebidas entre mulheres. Batizada de Vigitel, a pesquisa, feita em várias partes do País por telefone, procurou, entre outros assuntos, saber o quanto o brasileiro consome bebidas "em binge". O termo é usado todas as vezes em que um homem consome, de uma só vez, cinco doses ou mais de bebida. Para mulheres, é considerado beber "em binge" quando a ingestão é superior a quatro doses. Quando foi feita pela primeira vez, em 2006, a pesquisa mostrou que 8,1% das mulheres bebiam "em binge". Dados provisórios de 2008 mostram que 11% das mulheres apresentam esse novo padrão de consumo de álcool. Para Deborah, essa mudança de comportamento é fruto, entre outras coisas, da maior pressão da propaganda. "Até pouco tempo, as campanhas tinham como maior alvo os homens. Mas isso está mudando", completa. O coordenador da Unidade de Pesquisa de Álcool e Drogas da Universidade Federal de São Paulo (Uniad-Unifesp), Ronaldo Laranjeira, não se espanta com a nova tendência. "É um fenômeno semelhante ao que ocorreu no tabagismo. A igualdade entre gêneros ocorre em todas as áreas. Os riscos de doenças entre grupos também tendem a se igualar", observa. Laranjeira também não se espanta com os números totais apresentados pelo trabalho do Vigitel. Levantamento preliminar de 2008 mostra ainda que 29% dos homens disseram beber "em binge". O psiquiatra, especialista na área de álcool, garante que, quanto mais "frouxas" as regras sobre bebida, maior é o abuso, maior o número de doenças relacionadas ao álcool. No caso do Brasil, afirma, nos últimos três anos um outro fator colaborou: o maior poder aquisitivo. "É bobagem imaginar o contrário. Quando melhora a renda, há maior risco de haver abuso do consumo", completa. Para evitar tal reflexo, diz, é importante agir em outras áreas de prevenção, como assegurar a proibição de bebidas entre jovens, melhorar a fiscalização para evitar a associação de álcool e direção, colocar regras claras e severas para propaganda. "Mas o que assistimos é o oposto, é a apatia", completa. Ele cita a demora na avaliação do projeto que dá nova classificação às bebidas alcoólicas e lembra também da pouca fiscalização para a Lei Seca em várias partes do País. E o pior: a facilidade com que jovens têm acesso à bebida.
Agência Estado
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