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quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

TRAGÉDIA NO CARIBE - HAITI - O RETRATO DA DEVASTAÇÃO


PORTO PRÍNCIPE – Coberto em parte por um manto de fumaça, em meio à poeira e aos escombros, o Haiti contabilizava ontem que o número de mortos no terremoto de terça-feira poderia ultrapassar 100 mil. Doze brasileiros entre eles. O primeiro-ministro Jean-Max Bellerive, que deu a informação à rede de TV americana CNN, torce por um cálculo mais otimista. “Espero que as famílias tenham tido tempo de sair. Há tanta gente nas ruas e tantos bairros totalmente destruídos que não sabemos exatamente onde essas pessoas estavam vivendo.”

Vários prédios vieram abaixo com o tremor de 7 graus na escala Richter, considerado o mais violento a atingir o Haiti em mais de 200 anos. O prédio da ONU em Porto Príncipe desabou e chefe civil da Minustah (a missão de paz das Nações Unidas), o tunisiano Hedi Annabi, morreu. O corpo foi encontrado ontem nas ruínas. Cerca de 100 pessoas ainda estão desaparecidas só nos escombros do prédio da ONU na capital. O Palácio Nacional foi reduzido a escombros e dezenas de milhares de pessoas perderam suas casas. A Penitenciária Nacional, a maior de Porto Príncipe, também ruiu, e os detentos escaparam, o que aumentou o clima de insegurança e saques.

“Escutamos tiros e soubemos que é a policia tentando impedir o saque completo do mercadinho onde fazíamos nossas compras e que desabou”, contou a fotógrafa brasileira Cris Bierrenbach, via Facebook. O coordenador da ONG brasileira Viva Rio no Haiti, Valmir Fachini, ressaltou o medo de balas perdidas. “Nossa principal dificuldade neste momento é não poder ir da casa onde estamos, num lado da cidade, para o outro, porque há muitos tiros e sair à rua seria extremamente perigoso”, afirmou.

A Embaixada do Brasil também ficou comprometida. Funcionários estavam trabalhando quando o chão começou a tremer e o prédio a rachar. Ninguém ficou ferido, mas o prédio foi lacrado. “Foi como se uma onda passasse pelos nossos pés, e tudo começou a tremer. Corremos para o meio da rua e durante mais ou menos um minuto, entre gritos e coisas caindo, ficamos perto uns dos outros. As pessoas começaram a levantar os braços gritando ‘Jesus’ e ‘Bom Deus’, um posto de gasolina explodiu na quadra ao lado e feridos apareciam aos montes, dentro e fora dos escombros”, relatou Rodrigo Bulamah, estudante de antropologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp-SP), que fazia pesquisa de campo no Haiti.

Pessoas ainda cobertas de sangue berravam em desespero pelas ruas pedindo socorro. Outras vagavam com olhares perdidos, sem saber o que fazer e para onde ir depois de perderem parentes, a casa e os vizinhos. Praticamente não há hospitais intactos após o terremoto. O prédio da ONU e de muitos dos centros de ajuda humanitária – instalados no país após uma série de catástrofes já ocorridas no passado – também caíram ou estão comprometidos. Num cenário de devastação, muitos dos socorristas também estão precisando de socorro.

“Visitei centros médicos e a maioria não estava funcionando. Muitos estão danificados, e vi um enorme número de corpos. As pessoas estão reunidas fora, acendendo fogo nas ruas e tentando ajudar umas às outras”, contou pela internet Stefano Zannini, da ONG Médicos Sem Fronteiras.

“Os hospitais não podem lidar com todas essas vítimas”, reconheceu Louis-Gerard Gilles, médico e ex-senador, enquanto ajudava as vítimas. “O Haiti precisa orar. Todos temos que orar juntos.” Em Washington, o porta-voz P.J. Crowley disse que funcionários da Embaixada dos EUA no Haiti relataram cenas de destruição dentro e fora da capital. “Falaram de muitas paredes caídas e viram vários corpos nas ruas e calçadas que tinham sido atingidas pelos escombros.”

Nas praças públicas, milhares de pessoas cantavam hinos religiosos em busca de algum tipo de conforto. Enquanto isso, familiares levantavam lençóis cobrindo pilhas de corpos em busca de parentes mortos. “A cidade está destruída. A cena é de guerra, de bombardeio”, relatou por e-mail o brasileiro Flávio Saudade, capoeirista a serviço do Viva Rio, que estava em casa na hora do terremoto e viu casas da vizinhança irem abaixo. “Pelas ruas, há muita gente, correria. As pessoas estão disputando comida. Ainda há corpos pela rua, sob os destroços. Os mercados estão fechados. Não há nem como comprar comida.”

A tragédia afetou ricos e pobres. Em Petionville, distrito onde vivem muitos diplomatas e famílias abastadas, também havia casas e hospital destruídos. Um centro do Médicos Sem Fronteiras foi interditado e pacientes eram atendidos em tendas improvisadas.

Com o sistema de telefonia em colapso, a internet foi a única forma de comunicação no Haiti. O rádio, principal meio de comunicação do país caribenho com altos índices de analfabetismo, saiu do ar. Dezenas de comunidades em solidariedade ao Haiti surgiram nas redes de relacionamento. No Facebook, o grupo “O Haiti precisa de nós” já tinha mais de 10 mil membros poucas horas após sua criação.

“Essa é uma grande crise humanitária e as necessidades serão muito grandes”, disse o chefe humanitário da ONU, John Holmes, sobre a situação no Haiti. Segundo ele, as Nações Unidas lançarão um apelo mundial para o Haiti nos próximos dias. “O terremoto vai exigir grandes esforços de socorro”, declarou ontem o secretário-geral da entidade, Ban Ki-moon.

A Federação Internacional da Cruz Vermelha estimou que até 3 milhões de pessoas tenham sido afetadas. Paul Conneally, um porta-voz da Cruz Vermelha, lembrou que o Haiti é um dos países mais pobres no Hemisfério Norte e não está preparado para lidar com grandes desastres. Países e grupos humanitários internacionais, incluindo a Cruz Vermelha, lançaram um apelo para auxiliar o Haiti. A prioridade é tentar salvar pessoas entre os escombros e montar hospitais emergenciais para os feridos.

Fonte-JC

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