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segunda-feira, 8 de março de 2010

ESTUDOS CIÊNTÍFICOS - NORDESTE NÃO ESTÁ LIVRE DE TSUNAMI


Enchentes em Angra dos Reis, São Paulo e Ilha da Madeira, terremotos no Haiti, Taiwan e Chile. Não bastasse tanta calamidade no início de 2010, agora pesquisadores anunciam um tsunami no Oceano Atlântico. O alvo brasileiro: Fernando de Noronha e a costa do Nordeste acima da Paraíba.

A formação da onda gigante depende da erupção do Cumbre Vieja, prevista pelo cientista americano Steven Ward, da Universidade da Califórnia. O vulcão, localizado na Ilha La Palma, no arquipélago das Ilhas Canárias, perto da costa africana, entrou em atividade pela última vez em meados do século 18. “E seu ciclo é de 250 anos”, avisa o especialista em riscos geológicos da Universidade Federal da Paraíba Paulo Roberto de Oliveira Rosa. Ou seja, o gigante adormecido está perto de acordar de novo.

Não seria só a larva, mas também as paredes do vulcão, a causa do cataclismo. É que na última erupção cientistas registraram o aparecimento de uma grande fissura na parte oeste da cratera vulcânica, que fica posicionada virada para o Atlântico.

“Caso ocorra uma erupção de maiores proporções, acredita-se que um volume considerável de rochas e material da cratera deslize em direção ao oceano. Nesse caso, haveria um deslocamento da água do mar, vertical e para cima, de igual volume ao do material do deslizamento”, explica o coordenador do curso de Geologia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), João Adauto de Souza Neto.

Segundo o pesquisador, numa escala de milhares de anos há a probabilidade de ocorrer novos deslizamentos em direção ao Oceano Atlântico, provocando a formação de ondas.

O pesquisador recomenda às defesas civis se prepararem para o possível tsunami. “Temos que ter um serviço de informações eficiente para a população. O tempo de antecedência com que se conhece um fenômeno é o principal fator. O serviço de informações poderia ser ao estilo do meteorológico. Isso é o que ocorre em outros países do mundo”, justifica.

Para João Adauto, a defesa civil deve informar à população, o mais rapidamente possível, a possibilidade de erupção iminente nas Ilhas Canárias. “Para isso, precisa passar a acompanhar a atividade desse vulcão, a partir do contato com os pesquisadores que o monitoram.”

Quanto mais rápido for conhecida a iminência de uma erupção, diz o geólogo, melhor. Rápido, nesse caso, são dias ou horas. “A população do Nordeste que habita as áreas costeiras de relevo mais baixo deveria se deslocar para áreas mais elevadas das cidades litorâneas ou do interior. O recomendado é que fiquem em altitudes superiores às alturas das ondas do mar.”

Antes de alcançar Fernando de Noronha, a onda gigante atingiria os Estados do Ceará, Piauí, Maranhão e litoral norte do Rio Grande do Norte. “Paraíba está mais susceptível que Pernambuco”, acredita Paulo Rosa. A onda viajará, prevê João Adauto, numa circunferência crescente e em todas as direções, seguindo para a costa leste dos Estados Unidos e Canadá, Caribe, México e América do Sul.

SEM ALARDE

À frente da Coordenadoria de Defesa Civil de Pernambuco (Codecipe), o tenente-coronel Ivan Ramos garante que nunca ouviu falar sobre o Cumbre Vieja, tampouco sobre um tsunami. “É preciso ter cautela para não alardear a população”, adverte. Revistas de circulação nacional, no entanto, publicaram a notícia, assim como redes de TV a cabo exibiram recentemente documentários.

Na Flórida, informa Paulo Rosa, já há plano de evacuação para esse tsunami e os prédios estão sendo segurados. Enquanto o Estado americano se encontra a 4.500 quilômetros do epicentro da possível catástrofe, o Nordeste está a 4.200 quilômetros, isto é, mais perto ainda.

ONDA LEVARIA SEIS HORAS PARA ATINGIR REGIÃO


Seis horas: esse seria o tempo que o tsunami, uma vez formado na costa oriental da África, levaria para alcançar o Nordeste brasileiro. Antes passaria por Fernando de Noronha, onde ondas de quatro metros, chamadas de swell pelos surfistas, quando não empurram carros estacionados perto do porto e quebram píeres, levam à suspensão dos passeios de barco e do desembarque de navios em cruzeiro, por causa do mau tempo. O tsunami seria mais de 12 vezes superior a um swell.

O administrador do distrito estadual de Fernando de Noronha, Romeu Batista, afirma nunca ter ouvido falar sobre o fenômeno, mas demonstra interesse pelo assunto. “Vou procurar saber. É muito importante esse tipo de informação para quem lida com a administração pública.” A própria ilha principal, uma das 19 que compõem o arquipélago, é o topo de uma elevação da Cordilheira Atlântica, de origem vulcânica.

Na Paraíba, onde mais de 40 pesquisadores da universidade federal estudam as vulnerabilidades do litoral desde 1998, a situação de desconhecimento do fenômeno não é diferente da de Pernambuco. “Produzo conhecimento, concedo entrevistas e faço palestras, mas até agora não há um plano estadual para proteger a população do tsunami”, reclama o geógrafo da UFPB Paulo Roberto de Oliveira Rosa, professor do Departamento de Geociências.

O pesquisador defende a instalação de um marégrafo, equipamento para medir a amplitude da maré, nas capitais do Nordeste. “João Pessoa, que se situa na porção mais ocidental do Brasil e tem sofrido com a erosão costeira, só dispõe de régua, que faz uma medição muito menos precisa.”

Ele destaca a importância de um plano de evacuação para Fernando de Noronha, a apenas 3.700 quilômetros do epicentro do possível tsunami. “O Havaí, que fica a 7.500 quilômetros da costa do Chile, onde teve terremoto semana passada, ficou em estado de alerta e emitiu informes à população. A onda chegou lá com pouco mais de dois metros. Aqui os dirigentes pensam que vamos continuar para sempre deitados em berço esplêndido.”

Paulo Rosa revela que entregou ao Ministério da Ciência e Tecnologia projeto de pesquisa para estudar os possíveis riscos do tsunami na Paraíba. “Os estudos disponíveis são feitos por cientistas americanos e, claro, estão voltados para os riscos nos Estados Unidos.” Ele, no entanto, não teve recursos liberados.

O especialista diz que a defesa civil se coloca distante da academia. “Não é nossa função orientar a população sobre o que fazer. Produzimos conhecimento. Cabe ao poder público utilizá-lo na prática.”

Enquanto o tsunami não chega nem a defesa civil se posiciona sobre a possibilidade do fenômeno, Paulo Rosa se mantém afastado do litoral. “Moro no Jardim Cidade Universitária, que está num terreno 40 metros acima do nível do mar. Mudar para a praia nem pensar.”

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