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quarta-feira, 19 de março de 2025

REFLEXÃO - DIA 19 DE MARÇO - E SE NÃO CHOVER?


Quando chega o dia 19 de março, a inquietante questão que toma conta do agricultor nordestino, sobretudo do Sertão, é: “E se não chover no dia de São José, vamos ter seca?”

O Dia de São José, tradicionalmente muito venerado no Nordeste brasileiro, é um momento bem próximo de uma data importante do Calendário Astronômico, que é a ocorrência do equinócio, quando o Sol aparentemente se encontra sobre a linha do Equador. O dia e a noite, em 20 de março, têm a mesma duração em todo o planeta. A circulação atmosférica brasileira altera-se em seu novo ciclo anual, determinando deslocamentos do sistema atmosférico conhecido como Zona de Convergência Intertropical (ZCIT). É esta ZCIT que ocasiona as bem-vindas chuvas para semiárido.

A partir do equinócio de outono, a tendência esperada é a de que a ZCIT migre para o sul, deixando, com certeza, alegre o homem do campo. Quando existe o fenômeno El Niño, lá no Pacifico Central, ocorre um bloqueio atmosférico sobre o Semiárido e inclusive partes da Amazônia, que impede esse deslocamento do sistema atmosférico causador de chuvas na Região. Nesse caso a seca é quase que inevitável.

Luiz Gonzaga refere-se poeticamente a esse fascinante período nos versos da canção “A volta da Asa Branca”, quando diz: ‘’Já faz três noites que pro norte relampeia/ e asa branca ouvindo o ronco do trovão/ já bateu asas e voltou pro meu Sertão/ai, ai! Eu vou embora/ vou cuidar da plantação’’. “Planta-se em São José para colher em São João”, é a frase que muito se ouvia quando as variedades de milho tardio eram mais comuns e os 90 dias que separam as duas datas religiosas eram necessários para que as espigas chegassem ao “ponto de pamonha” e ficassem aptas para toda a culinária nordestina tradicional.

Apesar das sementes de milho, atualmente, serem precoces e a colheita acontecer aproximadamente 70 dias após plantio, a tradição religiosa/climática ainda permanece no inconsciente coletivo, com muitos milhares de trabalhadores do campo esperando pela interferência do Santo Protetor. Atualmente, as festas juninas mantem-se ricas de pratos feitos de milho, mas a mesa do período ganhou muitas guloseimas a base de mandioca cozida ou assada, farinhas, carne assada em formato de paçoca, bolos, tortas, churrasquinhos, escondidinhos, farofas coloridas e muitas outras iguarias vindas com a criatividade dos numerosos ‘’chefs” de cozinha que se dedicam ao período junino.

O dia de São José, os plantios que nessa data se estabelecem, e as tradições culinárias ou culturais ligadas a esses período alertam para a importância de uma pesquisa mais holística e ampla, especialmente de temas voltados para Agroecologia, Sustentabilidade, Agroclimatologia, Segurança Alimentar e Meio Ambiente. É cada vez mais necessário integrar o conhecimento sobre esses temas e compreender que os ciclos biológicos operam fortemente sobre os resultados da agropecuária no semiárido, independentemente das tecnologias adotadas. A Agroecologia ancora possibilidades de melhor compreensão sobre esses ciclos e respeito as tradições, o que pode tornar o sistema ecológico mais eficiente, reconhecedor dos limites de uma produção inteiramente sustentável.

Por  - Alineaurea Florentino Silva - Agrônoma e Pesquisadora da Embrapa Semiárido

Foto - Reprodução Internet

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