segunda-feira, 15 de maio de 2023

LEVANTAMENTO - JUROS ALTOS IMPACTAM MICRO E PEQUENAS EMPRESAS


Com a taxa básica da economia (Selic) estacionada em 13,75%, desde agosto de 2022, e o crédito escasso, as micro e pequenas indústrias brasileiras estão cada vez mais endividadas. De acordo com um levantamento nacional encomendado pelo Sindicato da Micro e Pequena Indústria do Estado de São Paulo (Simpi) 76% das empresas reclamam que estão sendo prejudicadas pelas taxas de juros e, em média, 26% estão com uma ou várias despesas atrasadas.

"A taxa de juros aparece como um dos principais problemas que está afetando o dia-a-dia das empresas, dificultando o crédito em geral, além da desaceleração da atividade econômica, que é reflexo também dos juros altos", afirma o presidente do Simpi, Joseph Couri, em entrevista ao Correio. Segundo ele, a taxa de reclamação contra juros altos varia de região para região, e é a mais alta do país no Nordeste, onde 83% de empresas sentem os negócios prejudicados pelas taxas de juros.

De acordo com o presidente do Simpi, o crédito para as pequenas e médias indústrias está escasso porque os bancos não têm interesse em emprestar, devido às perdas com grandes empresas que entraram com pedido de recuperação judicial, como a Americanas. "O fato é que isso está afetando 41% de todas as micro e pequenas indústrias", comenta.

Conforme os dados da pesquisa do Simpi, feita pelo Datafolha, a taxa de inadimplência voltou a subir entre fevereiro e março, na comparação com dezembro de janeiro, passando de 37% para 39%, na média nacional. Mas, no Nordeste e no Norte/Centro Oeste, as taxas são bem maiores, de 53% e 48%, respectivamente. "Tem um dado preocupante que é o seguinte: 50% das empresas não têm capital de giro suficiente para passar o mês, 9% têm mais do que o suficiente e 41% estão penduradas em bancos", destaca Couri.

Segundo ele, em média, 26% de todas as empresas estão deixando de pagar alguma conta, "seja um item, sejam todos", como banco, fornecedor, salário dos funcionários, imposto e despesas gerais. No Centro Oeste/Norte essa taxa foi a maior, chegando a 37%. E, no Sul, a menor, ficou em 20%.

Momento delicado

"Estamos em um momento extremamente delicado e ruim e isso, claro, vai começar a afetar o emprego. Tivemos uma interrupção do ciclo de crescimento de geração de vagas e o cenário que se apresenta merece uma profunda reflexão", ressalta o presidente do Simpi. "Estamos assistindo a uma movimentação a curto prazo e, se não houver uma redução da Selic, os problemas tendem a se agravar."

No último dia 3, o Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central, decidiu manter a Selic em 13,75% ao ano pela 6ª reunião consecutiva e ainda não deu sinais de quando pretende começar a reduzir os juros básicos. Uma das justificativas do colegiado é que as expectativas do mercado para a inflação ainda estão desancoradas, ou seja, acima das metas para este ano e do ano que vem, de 3,25% e 3%, respectivamente, com tetos de 4,75% e 4,50%.

Na ata do Copom, divulgada na última terça-feira, o Comitê reforçou a recomendação de "serenidade e paciência" com a atual política monetária e ressaltou que a o novo arcabouço fiscal, em tramitação no Congresso, não tem relação mecânica com a queda da inflação. Lembrou que ainda será preciso esperar a aprovação do projeto de lei da nova regra fiscal para haver algum impacto nas expectativas futuras do mercado.

Não à toa, analistas voltaram a apostar em uma queda da Selic somente a partir do segundo semestre, mas alguns não descartam manutenção da taxa básica no atual patamar até o fim do ano, pelo menos, pois a desaceleração da economia não está tão forte como o esperado, e há uma expectativa de aceleração dos preços na segunda metade do ano.

Na quarta-feira, por exemplo, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou alta de 1,1% na produção industrial de março, mas o indicador ficou estável no acumulado do primeiro trimestre, com a indústria da transformação encolhendo 0,3%. E, na sexta-feira, a alta de 0,61% no Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de abril, divulgado também pelo IBGE, ficou acima das expectativas do mercado, de 0,53%.


Remédio errado

Na avaliação de Couri, contudo, o Banco Central está dosando o remédio de forma errada para combater a carestia. "O BC costuma aumentar os juros para diminuir o consumo e está conseguindo, ao manter a Selic no atual patamar, desacelerar a economia. Só que a inflação que estamos vivendo não é de demanda, então, o remédio não seria adequado", diz. "Inflação de demanda ocorre quando há mais gente querendo comprar do que o produto que está sendo ofertado. E não é o caso. Hoje, há uma oferta maior do que a demanda, porque os trabalhadores estão endividados e não têm poder de compra para acompanhar a inflação, porque o salário não sobe na mesma proporção", explica. "O que vamos são produtos e insumos dobrarem de preço", complementa.

De acordo com Couri, existem 800 mil micro e pequenas indústrias em todo o território nacional e grande parte delas pode não sobreviver, pois os empréstimos via Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), são para poucos — apenas "1% das empresas" conseguem financiamento do banco. "A intenção é maravilhosa, ideia de juros mais baixos e condições especiais, mas o problema é a operação, tem muita burocracia", lamenta. Em relação à perspectiva do mercado de que o Banco Central só deverá reduzir a taxa Selic no segundo semestre, Couri sentencia: "A questão é saber quantos estarão vivos até lá".

Por Rosana Hessel - Correio Braziliense

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