No Congresso Nacional, assembleias estaduais e câmaras municipais elas são minoria. Com menos de 10% de inserção nos parlamentos brasileiros, as mulheres enfrentam barreiras para ingressar no mundo da política proporcional. E igual dificuldade para sobreviver nele: assim como em outros setores da sociedade, as senadoras, deputadas e vereadoras de todo o País, também encaram o peso de um sistema político-eleitoral machista, que se reflete nos seus cotidianos, e que as obriga a ter muito jogo de cintura e pulso para superar os obstáculos diários, em um universo predominantemente masculino.
Na Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe), por exemplo, as mulheres são sete de um total de 49 deputados. Não bastasse a baixa representação, a dificuldade se faz sentir em diversas nuances, inclusive em questões mínimas, estruturais, básicas, como um banheiro exclusivo para elas, que no atual plenário da Alepe inexiste. "O problema do banheiro é antigo. Há anos reivindicamos ao presidente Guilherme Uchoa, que justifica sua ausência, pelo fato do atual prédio ser tombado", diz a petista Teresa Leitão, que esclarece: as deputadas usam o espaço destinado às visitantes e funcionárias. Com a inauguração do novo plenário, marcado para agosto, a construção de uma toilete para as parlamentares está prometida.
Mas se a ausência de um banheiro próprio é constatada, e virou até uma espécie de "folclore”, em questões mais sérias, como a composição da mesa diretora, o assunto assume ares de guerra. Em toda a história da Alepe, houve apenas uma titular do espaço nobre, a deputada Adalgisa Cavalcanti, que legislou na década de 1940.
Atualmente, Socorro Pimentel (PSL) participa do espaço, mas como suplente. O projeto apresentado em 2015 pela então deputada Raquel Lyra (PSDB) para garantir uma mulher na mesa não encontra amparo e jamais foi levado ao plenário. Elas evitam falar abertamente, mas em reserva, contam que os deputados homens já avisaram: se ele for apresentado, será derrubado.
"Certa ocasião, um deputado me chamou para compor a mesa num evento, para "florir" e não discutir o assunto", relata Simone Santana (PSB), presidente da Comissão da Mulher. Ela diz que na Casa Joaquim Nabuco, as deputadas sofrem dificuldades, até mesmo, para debater assuntos estratégicos. "O machismo é muito arragaido. Sofremos preconceito até para debater economia. É como se a mulher não soubessse discutir temas relevantes", diz.
Por esse motivo, a socialista intensificou a agenda da comissão itinerante da mulher. Nela, as deputadas vão aos municípios para debater com as lideranças femininas, a fim de trazer demandas para a Casa Legislativa. No segundo semestre, Simone deverá deflagrar o projeto "Mulheres na Tribuna - Adalgisa Cavalcanti" - que visa levá-las à Alepe, a fim de capacitá-las.
Um jeito de driblar o paredão machista? A aspirante no Parlamento, Roberta Arraes (PSB) defende o empoderamento para mudar o cenário adverso. "Temos que expandir e incentivar as mulheres a participaram da política". Em um tom mais crítico, a deputada Laura Gomes (PSB) questiona os partidos e defende mais atenção na formação política dos quadros femininos, no que é acompanhada por Terezinha Nunes (PSDB).
Líder do governo, Isaltino Nascimento - um dos poucos a integrar a Comissão da Mulher na Casa - reconhece: " Infelizmente, o preconceito é uma realidade. Velado e diferente de antes, mas presente".
Tarefa tripla
Apesar da baixa representatividade, a Câmara do Recife tem suas contradições. As mulheres ocupam postos estratégicos. A campeã das urnas foi Michelle Collins (PP), com 15.357 votos; a liderança do Governo está nas mãos de Aline Mariano (PMDB) e o comando da oposição é de Marília Arraes (PT). Mas lá, como em outras Casas, elas também enfrentam muitos desafios.
A atual legislatura do Recife conta com seis mulheres e 33 homens, o contrário do percentual da população, que tem maioria feminina. A situação, que coloca a mulher como minoria política, tem consequências no cotidiano das parlamentares. Marília Arraes lembra que, em seu primeiro mandato, em 2008, a Casa também não dispunha de banheiro feminino. “Precisamos reivindicar”, relata. Quanto à presença de mulheres na mesa da Casa, o “caso” não foi resolvido .
Mas existem outros problemas, que os homens não percebem. As mulheres sim. Tendo se tornado mãe, durante o último mandato, Marília lembra das dificuldades em conciliar as tarefas. “A mulher trabalha em jornada tripla e a política exige muito de nós. Acabamos ficando ausente em casa, o filho sente falta e às vezes o marido não compreende. É preciso quebrar esse tabu”, diz. Aline Mariano também foi mãe durante a sua primeira legislatura e recorda que precisou da ajuda da família para dar conta de tantas responsabilidades. “Seria ótimo se pudéssemos ter os nossos filhos na Câmara, em algum espaço reservado, para amenizar essa nossa ausência”, desabafa.
Casada com o deputado estadual Cleiton Collins (PP), Michelle também sente a pressão de adequar a rotina entre a vida política e pessoal. “Meus filhos já são mais velhos, acabo trazendo eles para o gabinete. Às vezes, o professor particular está ensinando a lição aos meninos e eu acompanho, quando posso, para ver o rendimento deles. É puxado”diz.
Diferente
Existem exceções. Célia Cardoso (PSB) que coordena o espaço UVP Mulher, da União dos Vereadores de Pernambuco (UVP), está na Câmara de Arcoverde há oito mandatos.
Ela foi a primeira mulher vereadora no Sertão de Pernambuco. A sua presença no plenário fez com que outras mulheres se aproximassem da política na cidade. Hoje, Arcoverde é administrada pela prefeita Madalena Britto (PSB), e 50% dos vereadores são mulheres. “Poucas câmaras no Brasil têm esse arranjo. A minha participação na UVP Mulher é para mostrar que não precisa ser heroína para ser política. Com esse empoderamento que estamos buscando, basta apenas ter vontade e competência para fazer, para trabalhar de verdade”.
Da Folha de Pernambuco
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